Entrevistas

Farmacêutica das mudinhas, Lurdinha Reis consolidou suas empresas com escuta ativa e acolhimento

Maria de Lourdes Reis Oliveira, mais conhecida como Lurdinha Reis, se define como uma pessoa sonhadora, que está sempre em busca de algo mais. Tanto é que, apesar de ser farmacêutica e dona da própria drogaria, ela sempre buscou mais formas de ajudar os clientes para que se curassem não apenas da doença que apresentavam, mas também cuidando do emocional.

Assim, a goiana natural de Inhumas, conseguiu consolidar a própria drogaria, hoje comandada pela filha, e dedica-se integralmente às terapias holísticas, negócio com o qual trabalha atualmente. “Fui observando as pessoas e vendo que aquilo que estava oferecendo dentro da minha profissão não era suficiente. Passei a buscar coisas novas e transformação para quando parasse de trabalhar na drogaria”, conta.

Início de carreira

Mais que aptidão, já que sempre foi boa em química, o talento de Lurdinha para a área da saúde estava na família. Ela conta que tem livros de 1897 sobre saúde e remédios naturais herdados do avô materno Joaquim. Já a decisão de cursar Farmácia partiu de um convite do tio, professor da Universidade Federal Ouro Preto – Minas Gerais, que ela decidiu aceitar. Aprovada em segundo lugar, cursou a faculdade de Farmácia e Bioquímica e retornou para Goiás, onde mora até hoje, na antiga capital de mesmo nome.

Morar na histórica cidade de Goiás, aliás, não era uma coisa que a agradava ainda na juventude. “Me sentia tolhida. É um ambiente bucólico, tristonho. Quando saía de férias e voltava, ficava depressiva. Sempre quis ir embora daqui. Mas quando eu mudei para Goiânia, percebi que não me adaptava ao estilo de vida de cidade grande.”

Lurdinha então se deu conta de que seu trabalho teria ainda mais valor em uma cidade pequena, onde poderia ajudar mais pessoas com o seu conhecimento.  “Trabalhei em laboratório de análises clínicas, no início da carreira, e em vários hospitais”, lembra.

A goiana também foi servidora pública por cinco anos no Banco do Brasil. “Foi uma experiência importante que me ajudou a compreender como se trabalha com dinheiro e também a importância da hierarquia dentro de uma empresa. Isso foi fundamental para mim, quando tomei a decisão de abrir minha drogaria.”

Drogaria própria

Já em 1987, Lurdinha decidiu investir no próprio empreendimento. E, logo de cara, a agora empreendedora se deparou com um de seus maiores desafios: aprender a dar ordens. “Sempre trabalhei como empregada. Eu tinha de cumprir horários, uma hierarquia para respeitar e, de repente, eu era a chefe. Tinha que liderar, comandar, fazer compras, organizar horários, não somente os meus, mas das pessoas que eu contratava. Foi um período muito estressante, em que tive de aprender a empreender por duras penas”, continua.

Para viabilizar o negócio, Lurdinha investiu o fundo de garantia. Mas tinha medo de fazer um grande estoque e perdê-lo. “Meu marido, que foi meu grande apoiador, dizia que se eu não comprasse mercadorias, não teria o que vender. Eu pensava que teria de pagar pelos produtos com recursos próprios, o que na verdade era uma despesa da empresa.”

Felizmente, apesar das dificuldades iniciais, a drogaria cresceu muito rápido. Um dos motivos foi o fato de estar em uma cidade pequena. Porém, Lurdinha sempre teve um perfil cuidador, em que a habilidade para ouvir e acolher os clientes resultou em grande identificação por parte do público. 

A farmacêutica dos chás

Mais que a necessidade de vender, Lurdinha estava realmente interessada no que causava a doença dos clientes. “Geralmente, quem trabalha em drogarias pensa muito no lucro final.  Eu agia diferente e queria saber o que estava por trás daquela dor de cabeça, daquela crise de pânico. Muitas vezes, o cliente chegava com a receita, mas estava num estado tão intenso que eu a levava para a minha salinha e ensinava algumas respirações, para que ela aprendesse a conduzir o próprio corpo”, conta.

Assim, após longa caminhada trabalhando em conjunto com a indústria farmacêutica, ela percebeu que existem técnicas complementares para o tratamento das pessoas. “As chamadas terapias holísticas olham a pessoa como um todo, conseguem trazer responsabilidade para a pessoa, para que ela aprenda a se olhar, se perceber, se conhecer. Isso sim traz a saúde efetiva, mais palpável e durável. Quando cheguei a esta conclusão, fiquei muito desconfortável exercendo a profissão de farmacêutica dentro da drogaria.”

Foi assim que Lurdinha ganhou a fama na região de “a farmacêutica que indica chás”, pois quando o cliente ia ao estabelecimento para comprar um remédio, ela sempre o presenteava com mudas para que ele a cultivasse em casa e pudesse resolver as próprias questões futuramente. “Sei da importância do medicamento, mas quando você vê uma criança de 13 anos obesa e a mãe chega até você com uma receita de rivotril, aquilo me dava uma angústia tão grande…”, observa.

Florais de Bach

Lurdinha passou, então, a investir em formações holísticas. A primeira delas foi o Reiki, que inicialmente lhe causou um estranhamento, sem muito compreender a grandiosidade do que representava. Em seguida, veio a Auriculoterapia, baseada na Medicina Chinesa. “A Medicina Chinesa me trouxe essa maneira mais sutil de observar as pessoas. As terapias orientais dão essa visão mais humana sobre a pessoa, para que ela possa conhecer a própria saúde física, mental e emocional. O casamento da Acupuntura com os Florais, para mim, foi sensacional”, emenda.

Mas o seu grande diferencial, os Florais de Bach, chegou na vida da empreendedora de outra forma, ainda no início da década de 1980. “Achava que a minha filha era muito triste. Não conseguia entendê-la. Como é que eu ia cuidar da tristeza de uma criança? Então, fui buscar a solução nos florais.”

Apesar do interesse em se aprofundar na técnica, Lurdinha não tinha como. Na época ainda não havia internet ou outros lugares em que pudesse buscar referências, e mesmo que a terapia floral tenha sido desenvolvida entre a década de 1920 e 1930, na Inglaterra, ainda era pouco divulgada no Brasil.   Após muito procurar, finalmente nos anos 2000 encontrou um curso sobre o assunto.

Empreender

Deixar de ser CLT e servidora pública para ser dona do próprio negócio trouxe diversas vantagens para Lurdinha. A maior delas é a autonomia. “Consigo dar um direcionamento para as minhas estratégias. Quando trabalhamos em empresas, é comum dar ideias e elas não serem ouvidas. Mas quando você empreende, tem a oportunidade de colocá-las em prática, embora também sob as suas custas e responsabilidade. Também gosto da possibilidade de fazer o meu próprio horário, mas é preciso ter disciplina. Caso contrário, você trabalha 24 horas por dia”, comenta.

Já em relação aos obstáculos encontrados nesta jornada, a farmacêutica e terapeuta holística aponta a contratação de pessoas qualificadas como uma das maiores dificuldades. “Criei a ‘Bula da Farmácia’ em uma noite de inspiração e desespero, pois tive de contratar duas pessoas que não sabiam nada sobre o trabalho. Escrevi o guia, no dia seguinte eu o imprimi e nesta ‘bula’ haviam instruções detalhadas até mesmo de como atender telefone ou colocar o lixo para fora. Na correria do atendimento, do dia a dia, eu não tinha tempo de ensinar os colaboradores.”

Apesar do desafio de manter o capital de giro, pois a drogaria nunca teve um grande volume de dinheiro, a gestão financeira não foi uma grande questão na jornada à frente da própria empresa. “Sempre fui organizada na minha vida particular. Desta forma, sempre tive uma reserva e crédito quando necessário. Em todas as vezes que precisei fazer um financiamento bancário, as instituições me acolheram.”

Transição

Depois de 20 anos à frente da drogaria, Lurdinha foi orientada pela filha a se aposentar. Afinal, era início da pandemia e a goiana completaria 60 anos. A herdeira, também farmacêutica, então, assumiu o controle dos negócios. Já Lurdinha se sentiu livre para se dedicar integralmente a algo que já despertava o seu interesse: as terapias holísticas. “Queria trabalhar com alguma coisa que me permitisse a liberdade de escolher o dia e o horário, sem as amarras de processos burocráticos.”, continua.

Atualmente, além de aplicar Reiki, Acupuntura e os Florais de Bach, a farmacêutica também é facilitadora em cursos e forma novos profissionais. Ela se dedica ainda, mensalmente, a um projeto voluntário de atendimento gratuito a pessoas de baixa renda, pois acredita que os florais têm um grande potencial transformador na vida das pessoas e que ainda é pouco difundido.

Projetos para o próximo ano

Já para 2023, Lurdinha está preparando a reforma de um espaço terapêutico dentro da própria casa, onde vai ministrar aulas e atender clientes, além de produzir seus florais. “E continuo tendo o sonho de viajar. O próximo destino pode ser a Índia, onde pretendo ampliar meus conhecimentos em Ayurveda”, conclui.

Camila Bez

Jornalista especialista em contar histórias de superação. Feminista, sonha em criar um mundo mais igualitário e justo para as mulheres por meio da informação e do empoderamento econômico.

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